segunda-feira, julho 27, 2009

fragmentos

Meu encontro com o guerreiro oriental aconteceu por acaso.
Eu acabara de almoçar e saía do restaurante. Ao atravessar a rua, olhei para trás e vi sua figura.
Era um guerreiro sadio, baixo, um pouco atarracado e de porte robusto.
Carregava duas sacolas e era muito concentrado em seu caminhar.
Percebi em sua barba a necessidade de manter-se aquecido no frio invernal que fazia. Marchava alinhado como em uma tropa. Em seu semblante nada parecia mover. Se estava a ir para a batalha final, não sei. Porém se acaso a houvesse, já estava, nitidamente, pronto.
Na sua sacola parecia carregar, além de toda mística e sabedoria orientais, alguns trapos velhos e uma tesoura.
O encontro foi rápido. Ele passou e seguiu sem se virar ou mudar a velocidade e a rota em que caminhava.
De início não percebi suas origens, só dei conta de ser um guerreiro oriental quando, ao passar por mim, vi em suas costas, presa a uma corda fina e sutil como a linha que o conectara, há tempos passados, com a sua origem, a espada adunca e afiada dos seus antepassados, seu instrumento.

***
Pensar o tempo em questão de horas e minutos.
Bobagem.
O tempo é infinito como estar no círculo. A cada investida nos projetamos ora a frente ora atrás. Parece simples, porém nisso reside o infortúnio de não sabermos, quando nos projetamos, se nos projetamos a frente ou atrás.
Mas como então estamos inseridos no tempo? E sentimo-lo passar? (Sentimo-lo?)
O tempo não é. Não existe ao certo quem seja capaz de defini-lo. Estar no tempo é como viajar em uma pequena esfera que caminha sobre outra maior. O movimento não necessariamente teve fim ou inicio. E suas evoluções ou involuções não se definem se não por um olhar histórico. O princípio básico de um átomo.
Cada época incita à conexão com outra. Anos futuristas – ou pretensamente dispostos a trazer o futuro – e saudosistas – ou pretensamente dispostos a trazer o passado. Retornos e idas a partir de um ponto que não existe. Um ponto que pode ser a criação, mas não convém arriscar defini-lo. Não há no mundo – nesse instante fotografado e parado no tempo em que escrevo – capacidade para definir a posição exata do centro de onde partem as ondas particulares. O epicentro. De onde partem as modas, os desejos e particularidades dos momentos históricos. Existe sim, e disso faz-se prova o fato de estar a escrever isso e o fato de outro ler, possibilidade de distanciar-se minimamente do tempo e provar um olhar no mínimo menos infeccionado que o de quem joga o jogo do tempo e sua predileções. Infeccionado, sim. Quem se presta a observar profundamente realiza que existe a imunidade (ou tentativa de) ao tempo. O ponto inicial, a criação, Deus, a força primária – qualquer definição a que se agarre – criou o ser para existir apenas. Não sabia que no tempo também existiam vícios, erros, falhas. Nesse ponto defendo em parte o clássico ao moderno. O clássico desfruta daquilo que se estruturou com o passar. É cauteloso e não segue tendências. O moderno desfruta da busca. É dotado da instintividade do espírito juvenil, não é temerário e tudo arrisca se algo quer.
Voltando ao assunto, feita a idéia-base, o ser inserido no tempo pode desfrutar da existência: primazia máxima do universo. A consciência de estar inserto no momento. O instante que é eterno por ser infinito o tempo. Estar na esfera menor e ter a certeza que se tem contato com o infinito maior sem fim que reconfigura sua camadas a fim de dispor infinitamente a sua superfície ao estudo daqueles que se interessem e cheguem lá. Mas o ser foi contaminado com a moda. E a moda, os desejos e as particularidades são justamente efeitos da infecção. A contaminação acontece porque não se percebe o real valor de se estar no tempo e no caso de nós seres humanos de se estar no mundo, planeta Terra, mãe terra ou seja lá a definição que se aplique.
Quando se diz contaminação não se deixe levar pela má idéia de coisa ruim. A contaminação é a alusão e recurso poético-nominativo ao processo de contágio, pois a vida, a existência são nos menores dos detalhes, contagiantes.
Afastar-se requer no mínimo muita dedicação e não pergunte como estar apto a tal. pois agora mesmo nesse momento paira sobre a cabeça sedenta de tudo o nada. E sequer sei se realmente é isso fugir ao tempo ou estar nele de tal modo inserido que posso justamente por isso planejar a idéia que agora flui. Pode ser que a idéia que agora flui seja, ela mesma, mais um aparato demonstrativo desse tempo que é meu e tem carga e potência marcadas.

***
Eu carrego um instrumento.
Um instrumento sonoro.
Segui à risca as instruções
e me instruí.

O instrumento me permite ser o que não sou.
Através dele, prótese utilitária,
realizo o que não me é permitido
com meu parco material humano.

Eu, particularmente,
carrego um instrumento sonoro de cordas.
Seis cordas, as notas que lhes cabem
E o que disso posso fazer.


Com esse instrumento, instruo.
Procuro destruir o que incomoda o homem
Incomodar o homem – no íntimo
Fazer o som tocar os corpos, as mentes
e alcançar, enfim,
com esse instrumento infinito,
qualquer realidade.

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